Hoje, 4 de novembro de 2008, faz exatos dois meses que Waldick Soriano resolveu cantar seus males de amor em outros cabarés.
A data dificilmente será alçada ao panteão dos grandes acontecimentos da música brasileira, pelo simples fato de Waldick não ter sido alguém pertencente à casta do que se entende por "músico brasileiro". Waldick era um cantor exclusivo das suas próprias músicas, apenas isso. Não tinha relação direta com linhagens tradicionais do cancioneiro popular, como o baião, o samba-canção e mesmo o que se produziu na Era do Rádio. Waldick bastava-se como um autêntico bolerista apaixonado, daqueles cuja existência, em tempos de estilo cool e vozinha baixa, está mais ameaçada que rinoceronte cinza em terras africanas.
Cerca de um ano antes de pedir o chapéu e partir, El Gran Soriano foi personagem de um projeto lindo, rico e cheio de emoção (sincera) pilotado por Patrícia Pillar. O trabalho rendeu um ótimo documentário curta-metragem, um DVD e um CD – este dois últimos gerados de um show marcante realizado em Fortaleza, produzido também pela atriz. Quando se assiste ao filme ou ao registro do espetáculo, mesmo não tendo o DNA musical do astro, percebe-se de imediato a concretização de um corajoso projeto. Melhor: de uma linda homenagem.
Tanto o curta quanto o DVD evocam espontaneamente uma aura de homenagem em vida a um artista cuja percepção sobre fazer e viver de música ficou muito acima das questões tecno-mercadológicas de hoje em dia. Envolto no tradicional terno preto e devidamente protegido pelos indefectíveis óculos escuros, Waldick era capaz de externar os mais profundos sentimentos da alma masculina mirando-se sempre em histórias de final triste. Numa hora era a amada ingrata que não correspondia aos seus apelos, noutra era a paixão arrebatadora e fugaz de uma noite no bordel.
Cantor fundamental na construção da identidade verdadeiramente popular da MPB, Waldick Soriano se firmou e reafirmou como intérprete de um estilo praticamente exterminado da canção nacional: o de quem vivencia ali, em pleno palco, suas histórias de amor mal-sucedidas. A maneira forte e passional ao narrar o sentimento era o que prevalecia. O chapéu levemente caído e o olhar cafajeste, somados à voz sempre potente e marcante, moldavam um tipo raro e hoje praticamente extinto na cultura musical brasileira.
O jovem sanfoneiro baiano já havia trabalhado como garimpeiro e lavrador quando resolveu se inspirar no faroeste “Durango Kid” para incorporar a figura mítica do durão apaixonado. Patricia Pillar tomou para si o desafio de reapresentar esse personagem aos que pouco ou nada sabem dele, e o encarou da maneira mais franca possível, sem preconceitos ou estereótipos. O resultado é o retrato de um artista que não carecia de maquiagens e melindres – talvez por ter tido a exata noção das várias e inegáveis qualidades que possuía.
Um comentário:
Não vi o doc, já passou em circuito?
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