Jornalismo, na prática, é igual a andar de moto: por melhor que você seja, por melhor que você faça, uma hora você erra e cai. Não tem jeito, é assim.
A experiência de redação mostra, para os que já passaram por alguma delas, que checar o nome de um entrevistado, muitas vezes, é tão fundamental quanto ter a inspiração necessária na hora de escrever um texto.
A situação é particularmente desagradável: você produz uma matéria linda e enorme, puxada por um baita furo de reportagem, gráficos, números, aspas contundentes... e só depois de publicada é que você nota que o nome do cara é José e não João, ou que o nome da empresa é Mavena e não Vanema.
Babou, já era.
Foi-se por água abaixo, por um detalhezinho sórdido – mas que nessas horas faz toda a diferença – a senha rumo ao Prêmio Esso. E aí, como diz o nosso presidente, "ô meu, sifu...".
Sensação diametralmente oposta se dá quando você está tranquilão em casa num domingo qualquer, lendo o seu jornal, e se depara com uma barriga (erro, no jargão jornalístico) à la Ronaldo Fenômeno. A não ser que seja obra de um amigo seu, o constrangimento geralmente dá lugar ao escracho total.
Afinal, se errar é humano e se o ser humano é o único aninal que ri, logo rir do erro alheio é a coisa mais humana do mundo.
Prova disso é uma área da Folha Online que descobri sem querer no Google, intitulada "Círculo Folha". Uma espécie de toturial do jornal e do site, o local tem uma parte sensacional, e deliciosamente sarcástica, chamada Antologia do Erramos. Trata-se dos erros mais esdrúxulos, inacreditáveis, colossais, boçais, engraçados, impossíveis e humanos publicados na Folha de S. Paulo.
Tem coisas ali absolutamente maravilhosas, cuja maior função, além de nos fazer chorar de rir, é provar por a mais b que a arte de fazer um jornal diário passa pela ofício de limar as falhas nossas de cada dia.
Como canta Roberto Carlos, "somos seres humanos, não somos perfeitos... ainda".
Abaixo, um apanhado das 14 seções da área Antologia do Erramos:
Pérolas datilográficas
"No artigo 'A nova guerra civil', publicado à pág. 5-7 (Mais!) de 1°/10, onde se lê 'uma menina sexualmente retardada...', leia-se 'uma menina mentalmente retardada...';" (8.dez.95)
Heresias
"Diferentemente do que foi publicado no texto 'Artistas 'periféricos' passam despercebidos', à pág. 5-3 da edição de ontem da Ilustrada, Jesus não foi enforcado, mas crucificado, e a frase 'No princípio era o Verbo' está no Novo, não no Velho Testamento." (7.dez.94)
Gaiata ciência
"O quadro da edição de 9/1 de 'Ciência', referente à reportagem 'Viagra para mulher', à pág. 25 do caderno Mais!, indica erroneamente a vagina no local do ânus. No mesmo quadro, o testículo está incorretamente indicado no local do escroto." (14.mar.00)
Impropriedades literárias
"Diferentemente do publicado na pág. Especial 2 (Acontece) do último domingo (29/11), Arnaldo Jabor, e não Nelson Rodrigues, é o autor de 'Eu Sei Que Vou Te Amar'. Além disso, Rodrigues escreveu 'Vestido de Noiva' (e não 'Vestido de Noite'), e Ariano (e não Adriano) Suassuna escreveu 'A História do Amor de Romeu e Julieta'. " (1.dez.98)
A informação como ela não é
"Diferentemente do que foi publicada à pág. 1-5 (Brasil) de 6/6, o nome do prefeito de Araxá não é Geová Pereira da Costa, mas Jeová Moreira da Costa. Seu partido não é o PFL, mas o PL. O nome da secretária municipal de Educação é Romalia Porfírio, não Porfíria. O instrutor-chefe do Tiro de Guerra na cidade é o primeiro-sargento José Roberto Montandon, não tenente Montanom. O nome correto da escola municipal de Araxá é Escola Municipal Dona Gabriela. Os cerca de cem atiradores que reforçaram a segurança do presidente Fernando Henrique Cardoso na cidade não são de elite." (16.jun.95)
Proezas em língua pátria
" A peste pneumônica é transmitida por gotículas de saliva, diferentemente do que informou o texto publicado na pág. 2-10, no dia 24/09." (28.set.94)
Obs: O texto afirmava que a doença era transmitida por filhotes de perdiz. Quem editou o texto procurou um sinônimo para perdigoto, que pode significar tanto salpico de saliva como filhote de perdiz.
Proezas em língua estrangeira
"Diferentemente do que foi publicado à página 2-9 de 29 de maio, na reportagem 'Estrutura política do Brasil é um desastre', a região da Califórnia, nos Estados Unidos, onde se concentram as indústrias de computadores é conhecida como Vale do Silício." (18.jun.94)
Obs: Em inglês, Silicon Valley. Saiu publicado "Vale do Silicone".
Terminologia jurídica
"No título do alto da página 3-5 (São Paulo) de 7/7. 'Patroa é acusada de roubar empregada', a palavra 'roubar' (mediante violência) foi empregada incorretamente. O certo é 'furtar' (sem violência)." (11.jul.95)
Obs: Esse tipo de erro mereceu seis correções entre 1991 e 1996.
O que está por trás dos nomes
"O músico Carlos Santana é guatemalteco, e não mexicano, como informou reportagem à pág. 4-3 (Ilustrada) de ontem." (12.mar.96).
"Diferentemente do que informou ontem esta seção, o músico Carlos Santana é mexicano." (13.mar.96)
A dimensão das coisas
"A reunião do ministro Eliseu Resende com sua equipe durou quatro horas horas e não quatro anos, como foi publicado no caderno Brasil de 28/03." (30.mar.93)
Desserviço ao leitor
"O escritor Mario Vargas Llosa é um dos latino-americanos que participarão no dia 17 do seminário 'Europa e América 1492-1992, o Confronto de Duas Civilizações', em Turim (Itália), e não Federico García Lorca, como foi citado na edição de ontem da Ilustrada, pág. 5-2. Lorca era espanhol e morreu em 1936." (9.mai.91)
Quando um nome passa a ser um problema
"Diferentemente do que foi publicado na edição de ontem (São Paulo), a rodovia que passa pela cidade de Praia Grande chama-se Pedro Taques, e não Pedro Táxi." (20.nov.99)
Confusões histórico-geográficas
"Diferentemente do que foi publicado à pág. 1-14 (Brasil) da edição de 19/3, a Segunda Guerra Mundial começou em 1939, os EUA entraram na guerra em 1941, a Guerra dos Seis Dias foi em 1967, o presidente Richard Nixon (EUA) renunciou em 1974, Margaret Thatcher assumiu o poder no Reino Unido em 1979, o Muro de Berlim caiu em 1989, e o Iraque invadiu o Kuait em 1990." (27.set.95)
Vale mais que mil palavras
"A foto acima, publicada na seção 'Álbum d' viagem' da Revista d' de 8 de março, foi simulada por Fábio Cardoso de Almeida Filho. Ele nunca esteve no deserto de Neguev, em Israel, e a foto foi feita na praia de Santiago, no litoral norte, a 180 Km de São Paulo. A Folha errou também ao chamá-lo de artista plástico." (14.mar.92)
Divirta-se você mesmo em http://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/antologia_erramos.htm.
2 comentários:
Fala, Oldon!
Putz, que achado, hein! Muito bom...rs
abração
polito
Isso é especialmente complicado quando temos pouquíssimo tempo para bater a matéria.
Abraço, Cláudio
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