sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Belo Monte: quando o conteúdo vale menos que a panfletagem


O vídeo lançado no último 16 de novembro contra a usina de Belo Monte, estrelado por atores e atrizes de TV, teatro e cinema, levantou em mim duas grandes inquietações, uma de impacto direto e outra num campo mais subjetivo. O desconforto óbvio passa, evidentemente, pela enorme quantidade de informações mentirosas defendidas a base de interpretações apelativas e melodramáticas. Desempenho típico dos folhetins que muitos daqueles artistas estão acostumados a interpretar nas novelas ou nas peças – financiadas, em grande escala, a dinheiro público oriundo de impostos. Dinheiro meu e seu.

Não há ali preocupação alguma em apresentar alternativas sustentáveis do ponto de vista técnico, social, ambiental e econômico ao projeto. Vale apenas distorcer dados, conceitos e fatos históricos, tudo com o olhar da mocinha indefesa acuada pelo vilão. O resultado seria risível, não tivesse um efeito arrebatador aos olhos leigos da massa encantada com as estrelas. "Vamos lá, assina vai...", suplica a linda atriz. Quem não atenderia a um pedido desses? Noutro frame, o galã humorista, provavelmente sem saber diferenciar um megawatt de um megahertz, lhe intima a "fazer a sua parte". Lendo mais? Pesquisando? Conversando com especialistas? Não, somente replicando o palavrório pela internet. Simples, como convém.

É daí que vem o outro fato curioso que me chamou atenção tão logo o vídeo ganhou o mundo após ser publicado: a falta, por parte do público, de um pensamento formado sobre o que se está falando. A enorme repercussão que o trabalho – muito bem produzido, registre-se – obteve nas plataformas virtuais, tanto em sites de notícias e blogs quanto nas redes sociais, evidenciou a completa ausência de conteúdo crítico nas manifestações "conscientizadas" dos internautas. Jovens, até bem intencionados em sua grande maioria, escondiam por trás da indignação frente ao "monstro da floresta" ignorância pura, travestida muitas vezes da auto-suficiência típica da geração twitter.

Para um tema de tamanha complexidade como é o da energia, cuja compreensão sobre determinada questão exige a busca por informações técnicas geradas por fontes minimamente ligadas ao assunto, a reação imediata da maioria dos e-spectadores do vídeo foi a de absorver a expressão enfática do ator ou a convocação doce da atriz sem qualquer contestação. Revelou-se ali que importa muito pouco (ou nada) se a base do conteúdo e quem o sustenta são confiáveis ou não. Importante, nesse caso, foi apenas replicar e se vender como "mais um nessa corrente". Fazer-se notar como um agente repassador voraz e obstinado, uma espécie de panfleteiro virtual que só de ouvir falar já se vê capaz de levantar um protesto "contra tudo que está aí". Mas e o conteúdo?

Apenas para registrar um pouco da história: a discussão em torno da usina hidrelétrica de Belo Monte remonta o ano de 1980, quando foram finalizados os primeiros estudos de inventário da bacia do rio Xingu. À época, o plano de aproveitamento hidrelétrico da região era composto por duas usinas: a de Kararaô, com 11 mil MW de capacidade; e a de Babaquara, com 6,6 mil MW. Juntos, os empreendimentos trariam um impacto socioambiental que resultava em 18 mil km² de área alagada atingindo sete mil índios e 12 terras indígenas. São mais de 30 anos, período que o país estabeleceu sua redemocratização. Após várias alterações exigidas por órgãos ambientais e representantes da sociedade civil, o projeto atual de Belo Monte prevê uma área alagada de 516 km², sem que nenhuma das atuais 10 terras indígenas localizadas na região seja afetada.

A controvérsia quanto à existência da usina motivou, durante todos esses anos, defesas apaixonadas de lados contrários e favoráveis à sua construção, levando até mesmo a atos inaceitáveis de violência física, como os que fizeram sangrar um engenheiro da Eletrobras há poucos anos durante debate público com a presença de índios armados. Apesar disso, ambos os lados sempre se pautaram pela argumentação técnica e embasada para defender seus pontos de vista, ainda que essas argumentações partissem de premissas diferentes. Algo que essa nova geração, alimentada nas relações virtuais de até 140 caracteres, parece desconhecer. Ir além do copia-e-cola torna-se necessário quando o que está no centro de um debate é algo mais relevante do que a cor da calça da banda de rock do momento.

Eu torço para que ao menos um mérito o vídeo dos "artistas engajados" possa ter: o de fazer as pessoas saírem do conforto da discussão online rápida e rasteira e partirem para as pesquisas aprofundadas sobre o que de fato se passa no cenário energético do Brasil e do mundo. É daí que se espera que saiam as propostas cabíveis para expandir o setor elétrico brasileiro, material esse que os artistas não apresentaram e nem vão apresentar. Essa atitude, de se voltar para a busca do conhecimento, revelaria não só um ganho para a democracia, mas também um movimento inverso ao que se vê nos dias de hoje, quando não se sabe – tampouco faz diferença saber – pelo que ou por quem se está brigando. Basta apenas mostrar para quantos estamos fomentando essa briga.

6 comentários:

Zé Guimarães disse...

Parabéns Oldon.
Logo que comecei a assistis esse vídeo, estranhei sua qualidade - diria que excelente.
E no decorrer do vídeos, o argumentos loucos, beirando a imbecibilidade, em conjunto com uma encenação teatral que me fazia duvidar se era uma mera ironia ou de fato o que ""eles"" pensavam, confirmaram minha dúvida.
O Movimento Floresta Faz Diferença preza por algo que seria a espontaneidade dos diversos artistas. E nesse ponto é importante ressaltar ARTISTAS, já que nesse vídeo Gota D'água há apenas ATORES - cuja profissão é decorar texto e atuar (diga-se de passagem, foi engraçado ver alguns deles como que lendo o texto ali enquanto gravava mesmo - é possível ver que seus olhos não miram a câmara).
E ainda, o Floresta Faz Diferença está embasado em fatos mais plausíveis, haja vista que é um "mero" projeto de lei embasado por deputados com o mínimo de conhecimento e com ambições meramente econômicas, dentro da agricultura. Diversos desastres que poderia ter sido evitados pela simples ocupação de encostas com vegetação poderiam ter sido evitados.. Enfim, é um movimento mais promissor, ético e correto.
Falo apenas para efeito de comparação.

É sabido que qualquer obra irá possuir um impacto ambiental, e de uma maneira ou de outra irá afetar algumas pessoas.
O contraponto é o quanto irá beneficiar outras e o quanto as pessoas afetadas estão dispostas a receber em trocar um benefício compensador.
Tive uma experiência no passado que em muito se assemelha ao que vem acontecendo com Belo Monte. No meu caso foi referente a uma área que estaria mais adequada para implantação de um Aterro Sanitário. Aconteceu que uma fração da área estaria inserida na plantação de um assentamento do MST. Foi um alarde geral e tivemos que redirecionar a área e perder cerca de 2 anos de funcionamento do aterro devido a redução da área. Afinal, pensávamos, como poderíamos suprimir uma plantação de alimentos....? Não podemos!
Bom, fomos averiguar a área, e se tratava de uma plantação de estacas de madeira para futuras invasões....
O EIA do aterro foi reprovado devido a opinião pública - estando todas as conformidades técnicas adequadas.
E isso tem 3 anos, e a cidade está no limite de uso de seu atual lixão, bem como as outras três que fariam parte do consórcio de uso o Aterro Sanitário.

É isso...
queria só te parabenizar pelo texto.
Salientar minha desconfiança com o vídeo, e expor de maneira breve um acontecimento comigo que possibilita enxergar de mais objetivamente alguns problemas de cunho ambiental perante algumas obras.

Renata disse...

Falou muito bonito e não disse absolutamente nada, a não ser criticar meios de comunicação ao qual o próprio se beneficia...
Entendi apenas que você é a favor da construção de Belo monte, mas porque mesmo?
Vamos ver ignorantes como são os usuários de redes social não adiantaria falar...
Lamentável a sua matéria, não por expor a sua opinião, mas pela maneira agressiva que o fez...
fazendo jus a velha expressão a melhor defesa é o ataque.

frann disse...

Concordo plenamente com a Renata, não precisa ser nenhum especialista no assunto, como no vídeo mesmo foi mostrado, para saber que a usina vai trazer danos ambientais.

Da mesma maneira que os artistas não colocaram solução, esse artigo também não tem solução alguma e nem explica o por que exatamente de ser uma usina hidrelétrica.

A minha pergunta fica, por que não investir em energias renováveis?
por que não investir em usina eólica?
Por que não investir em células fotovoltaicas?

Era SÓ isso que eu queria saber!

Oldon disse...

Olá,
Segue uma complementação do post que fiz anteriomente.
Abraço, Oldon.
http://www.blogdooldon.com/#!/2011/11/porque-inserir-discussao-sobre-belo.html

Anônimo disse...

Como assim "ausência de conteúdo crítico"? Essas informações que você diz ser mentirosas é retirada da reportagem do mais respeitados especialistas na área energética do país, o professor da USP Célio Bermann.

http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2011/10/belo-monte-nosso-dinheiro-e-o-bigode-do-sarney.html

Anônimo disse...

"A Belo Monte é uma questão que está por aí há mais de 20 anos e o estardalhaço só começa agora, por causa de um movimentozinho de estrelas semianalfabetas que provavelmente não sabem nada sobre o assunto que estão falando?"

https://coisascato.wordpress.com/2011/11/28/34/