segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Um erro perigoso


Da parte visitante, a impressão que ficou é que praticamente ninguém parecia estar se importando muito com o Botafogo x Flamengo do Engenhão, valendo pelo returno do Brasileirão. Da direção do Clube aos jogadores, passando pela Comissão Técnica e pelos formadores de opinião / influenciadores, pouco se ouviu e se falou até pouco antes da partida.

Uma pena e um erro, que só expõe a forma torta como se enxerga e se trabalha o principal produto do futebol nacional. Fazer do Campeonato Brasileiro um apêndice de outras "prioridades" (Libertadores, Copa do Brasil, Sul-americana) é jogar fora, às vezes muito cedo, o ganha-pão dos clubes durante a maior parte do calendário. Repito: uma pena e um erro.

O reflexo disso, meio óbvio até, é que a própria torcida passa também a não se importar com a competição. Aí não é só um erro: é um perigo. Ontem, em um clássico local disputado no Rio de Janeiro e valendo posição importante na tabela, tivemos a vergonhosa marca de 238 flamenguistas apoiando o time no estádio. DUZENTAS E TRINTA E OITO PESSOAS.

Jogo oficial. Clássico. Campeonato Brasileiro. Rio. Tempo bom. Time no G6.

Qual a desculpa? Preço do ingresso? Crise? Violência?

Para mim, nada justifica um público desse.

Talvez tenhamos tido ontem, neste triste Botafogo 2 x 0 Flamengo, um histórico recorde negativo de público rubro-negro em estádio em se tratando de um clássico local, disputado dentro da cidade e valendo pontos.

Uma vergonha completa.

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Há 20 anos, um acachapante Flamengo 3 x 0 Real Madrid

Há exatos 20 anos, em 15 de agosto de 1997, o Flamengo MORALIZAVA o poderoso Real Madrid – então campeão espanhol – pelo Torneiro Palma de Mallorca, na Espanha. Sapecou nada menos que um 3 x 0 sem dó, com gols de Maurinho (é seleção!), Lúcio Bala e Sávio – este, aliás, acabaria se transferindo para a equipe merengue logo após a bela atuação pelo rubro-negro.

Hoje, além de raros, os confrontos entre brasileiros e europeus infelizmente expõem, quando ocorrem, o abismo colossal entre os dois mercados, algo que duas décadas atrás não existia nessa proporção gigantesca.

Em tempo: esta foi a última vez em que as duas equipes se enfrentaram, com mais dois jogos tendo sido realizados em 1978. O Flamengo tem duas vitórias e o Real Madrid, uma.



Partida: Flamengo 3 x 0 Real Madrid

Data: 15/08/1997

Local: Estádio Carlos Belmonte, Mallorca (ESP)

Competição: Torneio Palma de Mallorca (torneio amistoso internacional)

Flamengo: Clemer; Fábio Baiano (Leandro Neto), Júnior Baiano (Juan), Luís Alberto e Gilberto; Jamir (Bruno Quadros), Jorginho, Maurinho e Sávio (Iranildo); Renato Gaúcho (Rodrigo Mendes) e Lúcio. Téc.: Paulo Autuori.

Real Madrid: Cañizares; Secretário, Sanches (Vitor), Panucci (Chendo) e Karanka; Jaime, Seedorf (Gutti), Amavisca (Zé Roberto) e Mijatovic; Raul e Suker. Téc.: Jupp Heynckes.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Reflexões sobre um Flamengo à procura de rumo


Quinta-feira, 3 de agosto de 2017. Dia com o sabor amargo da ressaca moral. Com a dureza do choque de realidade. Com a frieza da ducha de água gelada de um mundo como ele é, e não como deveria ser. Vale para o Brasil, vale para o Flamengo. Falarei rapidamente sobre este segundo, cujo futuro pelo menos ainda me traz algum tipo de esperança, embora o presente exija reflexões.

O Flamengo reestruturado institucionalmente, recuperado financeiramente e incensado administrativamente passa, sim, por uma crise de identidade. Dentro e fora dos campos. Talvez uma crise menos grave que a de tempos atrás, quando as perspectivas eram desanimadoras em quase todos os níveis e áreas, mas não menos importante de ser discutida, avaliada e devidamente tratada.


Fora das quatro linhas, o problema principal passa pela transição da Era Maracanã para a Era do Estádio Próprio – neste primeiro momento representada pela casa provisória na Ilha do Governador. Como ajustar a demanda cada vez maior de um público diverso e gigantesco, como é a massa rubro-negra, às necessidades de caixa do clube? Como garantir as maiores receitas financeiras possíveis com a realização de jogos sem alijar parte do povo flamengo do seu time de coração? Essas e outras questões
 estão em aberto, e se colocam a cada partida jogada numa Ilha do Urubu de parcos 20 mil assentos, quase sempre não preenchidos na sua totalidade em virtude de preços praticados acima da média.


Mas a questão que mais aflige o torcedor, hoje, está situada dentro de campo, curiosamente a área na qual menos se depositava preocupação à medida em que o belo elenco que temos atualmente vinha sendo construído – ok, construído no meio da temporada, mas mesmo assim a tempo suficiente de entregar resultados. Eliminado precocemente da Libertadores e claudicando no Brasileirão, o Flamengo vive uma realidade distante das suas pretensões iniciais. Futebol débil, time em constante mutação e sem padrão tático algum, desempenho técnico sofrível dos principais nomes, insistência na escalação de nomes menos cotados, atuações regularmente fracas do conjunto, técnico demonstrando cada vez menos repertório. O lugar no G6 tem cara e jeito de meio de tabela. O viés, inegavelmente, é de baixa.


Além de discutir as pessoas – que podem e devem ser cobradas no dia a dia, especialmente quando têm todas as condições estruturais de trabalho à disposição –, talvez seja o caso de também se discutir as filosofias, no plural.


Discutir a filosofia do comando do futebol, que parece se apegar a uma profecia irrefutável a ser confirmada a qualquer custo, mesmo quando os fatos esfregam na cara de todos um quadro totalmente oposto. Arrogância típica de quem se vê como um doutrinador de teses no cargo de gestor, justamente quando a gestão mais carece de ideias arejadas. Discutir a filosofia da torcida, que viu no poderio financeiro uma porta de acesso direto às conquistas de tudo – os tais "entreguem as taças" e "Brasileiro é obrigação". Arrogância típica de novo rico premiado na Mega-Sena, que na euforia tem a certeza de que o dinheiro tudo pode comprar, sem enxergar que valores imateriais são inegociáveis em papel moeda.


Os conflitos que circundam o Flamengo nos dias de hoje tem um quê de existenciais, de foro íntimo-institucional, e refletem, ao meu ver, um clube em mutação, saído de (muitos) anos amadorísticos e vislumbrando uma fase duradoura de liderança. A ansiedade pelos resultados crescerá à proporção em que as finanças polpudas resultarem em cifras de investimentos cada vez maiores, em um aparato infraestrutural cada vez melhor e em contratações cada vez mais midiáticas.


Lidar com a pressão é natural para quem vive diariamente o Flamengo, da arquibancada aos gabinetes, mas lidar com a obrigação do protagonismo é algo ainda a ser melhor ajustado na cabeça de dirigentes, dos membros da comissão técnica, dos jogadores e da torcida – seja o mais abastardo que pode ir a todos os jogos, seja o menos favorecido que vê e sofre de longe.


Se o virtual campeão brasileiro de 2017 se autointitula realisticamente como "o time que sabe sofrer", o Flamengo rico, teimoso, trôpego e perdido de 2017 poderia se assumir, num ato de sincericídio, como "o time que (ainda) não sabe ganhar".


SRN

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Axé da Bahia, do Brasil para o mundo

São muitos os méritos de "Axé - Canto do Povo de um Lugar", documentário que estreou ontem nos cinemas narrando a história de linhas tortas, mas de estrondoso sucesso, da música carnavalesca feita em Salvador para o Brasil e o mundo. O filme abrange todas as pontas do movimento musical que nasceu mambembe e cresceu estruturado como indústria, fomentando músicos e compositores, gerando milhões em receita e consagrando dezenas de artistas como astros e estrelas do showbiz nacional.

Como documento histórico, o longa-metragem de Chico Kertész tenta decifrar a origem do som dançante que dominou as paradas de sucesso de rádios e TVs brasileiras por mais de duas décadas, e acaba mostrando que tudo cabia naquele liquidificador sonoro: o frevo dos trios elétricos dos anos 1970, a guitarra baiana de Armandinho, as influências latinas de Gerônimo, a batida do samba-reggae criada por Neguinho do Samba para o Olodum. Tudo podia ser "axé music" naquele cenário de efervescência e inventividade que dominava a cena cultural soteropolitana, alimentada pelos investimentos em novas bandas feitos pelos blocos de carnaval e pelo estúdio WR.

Luiz Caldas, como o primeiro astro nacional do movimento, trouxe consigo uma primeira leva de artistas para um Brasil que aprendia a dançar com trejeitos e sotaques. Vieram Reflexus, Banda Mel, Chiclete com Banana, Sarajane, Cheiro de Amor, Banda Beijo... Em Daniela Mercury, a primeira estrela internacional. Um furacão que pôs a Bahia, a partir do início daqueles anos 1990, como o principal polo produtor das maiores e mais impressionantes vendagens da indústria fonográfica brasileira por anos seguidos – Banda Eva, Netinho, É o Tchan! e Terra Samba tiveram um punhado de discos de diamante (mais de 1 milhão de cópias por álbum) para chamar de seus.

Fechando com o fenômeno Ivete Sangalo – há mais de uma década a artista mais popular do Brasil – e apontando para Saulo Fernandes o que pode ser a continuidade num momento de declínio comercial e de prestígio em baixa, muito em função da perda de conexão com a nova geração consumidora, "Axé..." retrata com fidelidade e precisão o movimento musical de maior sucesso do país surgido e estruturado 100% fora do eixo Rio-SP. Uma monstruosa indústria de ritmos, hits, modismos, lucros, egos e sonhos que só podia ter acontecido, do jeito totalmente porreta que aconteceu, na Bahia.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Dez discos de 2016 para se escutar em 2017 (e em 2018, 2019...)

24K Magic (Bruno Mars): O melhor do new jack swing noventista rejuvenescido em grande estilo pelo cara que manda e desmanda hoje em dia.

- ANTI (Rihanna): Contando com uma excepcional releitura de "Same Ol' Mistakes", do Tame Impala, a mulé lacrou geral nazinimiga – de novo.

- Blackstar (David Bowie): Uma aula de dignidade e de boa música no epílogo de um grande mestre. Cara que faz uma falta da porra...

- Blue & Lonesome (The Rolling Stones): As raízes expostas no blues que ajudaram a forjar a maior banda de rock em atividade. Imperdível.

- Duas Cidades (BaianaSystem): O pós-Axé que pulsa na periferia de Salvador fala pro mundo inteiro. Coisa de gente grande e antenada.

- Gatos e Ratos (Odair José): O cronista popular reencontrou a boa forma no bom e velho rock'n'roll. Não sobra pra ninguém neste ótimo disco.

- Mahmundi (Mahmundi): Principal revelação da música brasileira em 2016. Álbum que renova as esperanças em muita coisa. Apenas excelente.

- O Problema É A Velocidade (Emanuelle Araújo): A baiana tirou onda com um disco lírico, cheio de nuances, mas sem dispensar o suingue nagô.

- Sky High (Fish Magic): O segundo trabalho solo do brother Mário Quinderé é denso e bebe de muitas fontes, resultando num rock atemporal.

- Starboy (The Weeknd): Apesar de excessivamente longo, o petardo pop tem belíssimos momentos, como as duas parcerias com Daft Punk.